Em primeiro lugar, os projetos educacionais do Banco Mundial (sempre lembrando que os interesses do Banco Mundial são os interesses dos seus principais "acionistas": os países mais poderosos do globo) foram feitos por economistas. Portanto, a ênfase será sobre a regulação do custo X benefício, e não sobre a qualidade da instrução. A regra é diminuir custos e ampliar a abrangência da educação - atender a mais pessoas.
O pensamento é extremamente simples. Qual é o maior problema na educação dos países em desenvolvimento? É o analfabetismo? Então, este é o problema a ser combatido. Medidas para se tomar:
* Deve-se investir em infra-estrutura para a educação, como livros didáticos ou bibliotecas. Um livro didático pode instruir várias pessoas, por vários anos. Uma biblioteca bem equipada pode instruir uma cidade inteira. Por isto, o Banco Mundial tem financiado a construção de bibliotecas e o melhoramento da qualidade de livros didáticos em muitos países em desenvolvimento - o melhoramento é questionável: seria uma adaptação dos alunos aos ideais capitalistas, ou o fornecimento de condições para que o aluno realmente aprenda os conteúdos progamáticos?
* O número de alunos em cada sala de aula deve ser aumentado. Um professor que ensina trinta crianças pode (segundo o Banco Mundial) ensinar cinqüenta também, sem prejuízo da qualidade da educação. Desde que os livros didáticos sejam eficientes para a instrução. Colocar mais crianças em cada sala de aula significa diminuir custos (com professores, principalmente) e aumentar benefícios (mais crianças alfabetizadas).
* Os professores são causadores de problemas em potencial. Como sempre, os recursos humanos são os maiores problemas de uma empresa, pois há as questões de aumento de salários, sempre impertinentes, e greves. Diminui-se a qualidade do ensino. Então, deve-se trabalhar para que a educação dependa o mínimo possível de recursos humanos. Daí o interesse pelo investimento em infra-estrutura. Os professores não são considerados como prioridade para o Banco Mundial; há portanto o sucateamento da profissão de professor, baseado na crença de que, se bem equipada, qualquer pessoa pode ensinar crianças, sem necessidade de maiores treinamentos.
* Se a necessidade principal é alfabetizar a população, decresce o interesse no ensino superior. Já que o povo é analfabeto, como pensar em ensino superior? Os que quiserem ensino superior, que paguem por isto. O mais importante é o ensino básico. Não se valoriza as universidades que formarão os professores para a alfabetização das crianças porque os investimentos em infra-estrutura permitem (segundo o Banco Mundial) que qualquer um seja capaz de alfabetizar uma criança (uma afirmação baseada em pesquisas bastante duvidosas).
As pesquisas realizadas pelas universidades não são necessárias. Estas têm o objetivo de fazer ciência, novas descobertas, novas teorias. Mas estas pesquisas já são feitas nos países desenvolvidos a contento. Então, não é necessário realizar pesquisas nos países subdesenvolvidos; estas não se justificam pelo critério custo X benefício. A única utilidade que as pesquisas feitas nos países subdesenvolvidos teriam seria a descoberta de novas tecnológias que permitam certa independência tecnológica destes países com relação aos países desenvolvidos, que têm como principal lucro a exportação de tecnologia. Portanto, realmente não interessa para o Banco Mundial a pesquisa nos países subdesenvolvidos.
* O custo de formação de mão-de-obra deve cair cada vez mais. A escola não deve fornecer almoço, por exemplo. Este pode corrigir até problemas crônicos da população mais carente, sendo um projeto social. Mas o interesse da escola deve ser a formação, razão da existência da escola. Sendo assim, em vez de fornecer um almoço, a escola pública oferece a merenda, destinada a resolver um problema imediato: as crianças não aprendem num bom ritmo se tiverem fome. A merenda resolve o problema do momento; as crianças comem um pouco, enganam a fome e podem estudar de novo. Simples e rápida solução de problemas imediatos.
* Uma lei levada em consideração é quanto mais tempo na escola, mais se aprende. Portanto, busca-se aumentar o número de dias letivos por ano. Um intento que está por trás disto é que, com mais dias letivos por ano, pode-se diminuir o número de anos necessários para a formação dos alunos. Com menos anos letivos, a formação "concentrada" (com mais dias por ano) colocará mais pessoas no mercado de trabalho, o que barateia a mão-de-obra. Não é a toa que valoriza-se cada vez mais o ensino não-presencial, os cursos supletivos e a diminuição do número de anos do ciclo básico.
É importante dizer que o analfabetismo é uma preocupação para o Banco Mundial por motivos também econômicos. Num mercado globalizado, é natural que as empresas multinacionais migrem dos locais com mão-de-obra mais cara para os países com mão-de-obra mais barata - os países subdesenvolvidos. Portanto, é necessário qualificar minimamente a mão-de-obra dos países subdesenvolvidos. Daí a idéia de alfabetizar o máximo de população possível dos países pobres.
Aumentando o número de pessoas alfabetizadas, aumenta-se o número de mão-de-obra minimamente qualificada. Como a valorização do emprego depende da lei da oferta e da demanda (e, neste caso, com pouca oferta de emprego e muita procura), diminui-se o custo de produção.
Com professores sucateados e alunos cada vez mais pragmáticos, a última das conseqüências seria a retirada da subjetividade de professores e alunos. O "querer", o íntimo, o idiossincrático de cada pessoa fica abandonado na escola. Tudo começa com a desvalorização do que o aluno aprende fora da escola. O ser do aluno, anterior à entrada na escola, não é levada em conta. As atividades que o aluno desenvolve fora da escola não são tomadas em sala de aula para auxiliarem na educação (exemplos práticos deveriam ser sempre bem-vindos). Projetos extra-escolares, como por exemplo uma horta escolar, um projeto didático (da área da Biologia, por exemplo) e comunitário, são iniciativa rara. Como a escola é necessária para os sujeitos adquirirem uma ocupação (que todos têm, ou pelo menos deveriam ter), o que acontece é a retirada da subjetividade da sociedade como um todo. A crítica da sociedade será cada vez menos comum, os desejos individuais não serão levados em conta. Bom para o mercado, não tão bom para as pessoas. Talvez nada bom para as pessoas.
terça-feira, 31 de março de 2009
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